segunda-feira, 2 de setembro de 2019

OFF Aliados: Capitulo 9 - "À estaca zero"


(Por Franco)



Meu nome é Franco Alfaro. Sou filho de Mirta Pereira e Luis Alfaro. Minha mãe é bêbada e meu pai um ladrão. Meu irmão também é ladrão, e bêbado. E eu.... Bom, me criei nessa casa.


Me pedem que eu me resgate, mas as vezes você não pode. A única coisa que importa é sobreviver. O problema é quando isso que você precisa para sobreviver se mostra inalcançável. Se sobreviver já é difícil, tente sobreviver se portando bem. As pessoas acreditam que alguém se mete em desordem porque gosta, não porque não tenha outra opção.




Não entendo quando te dizem para fazer boa letra, se já está tudo escrito, ou não?

Me pediram para escrever como me sinto e a verdade.... por agora estou joia. Pensei que me custaria mais fazer boa letra. Quando está acostumado a fazer tudo mal é estranho sentir que está bom fazer algo bem, você sente que está traindo você mesmo, e gosta disso. Não sei como explicar, é muito louco!


A pessoa está acostumado a se meter em desordens, e sente que a desordem o procura, mas quando se dá conta que pode evitar, que há coisas melhores para fazer, aí vai caindo a ficha. Não é que a pessoa não queira se resgatar, o que acontece é que quando você vem com falhas de fábrica é mais fácil fazer as coisas mal, do que fazer bem.

Quando alguém está acostumado a sobreviver e nada mais, faz qualquer coisa, menos aproveitar. E está tão bom aproveitar, rir, se divertir, relaxar.... são coisas que são esquecidas quando se está metido em desordem, a única coisa em que pensa é em se libertar.


Mas a pessoa não se entusiasma muito: quando está apreciando o gostinho de voar, te baixam em um golpe.

Depois de andar toda sua vida na má, você se esquiva da boa. Não porque não quer, e sim por medo de se acostumar e depois perder. Quando se é criado em uma casa sem teto, não se entusiasma muito com os dias de sol, porque ele sabe que cedo ou tarde virá uma tempestade. Quando a esmola é grande, o santo desconfia. Por isso os caras como eu desconfia quando a vida nos dá algo bom.


Se acostumar com o NÃO é fácil, o duro é quando se entusiasma com um SIM, porque aí o NÃO doi mais. Quanto mais se acostumar com as carícias, mais doem os golpes. Quanto mais alto salta, mais vai doer a queda. Quanto mais abrir seu coração,  mais fácil é quebra-lo. Isso nós que nascemos na lama sabemos muito bem: quanto mais força fazemos para levantar a cabeça, mais as mãos afundam. Você não se engana com o sonho de felicidade porque o desengano doi mais que mil golpes.


Os caras como eu não nos entusiasmamos com o futuro porque sabemos que o passado sempre virá nos buscar. Assim são os desgraçados, não nos entusiasmamos muito com a felicidade porque por mais avanços que façamos sempre vai acontecer algo para nos levar a estaca zero.


(Inti)


Há uma estranha sincronia entre todas as nossas missões: todos, de alguma maneira, vão percorrendo um caminho similar. Todos passaram de não querer nenhum tipo de ajuda, a se atrever a sonhar que uma vida melhor era possível. Mas, claro, o carma negativo de tudo que fizeram antes se paga, como se tivessem caminhado por uma pegada muito profunda e marcada da que não podem sair. Mesmo que queiram ir por outro caminho uma força muito poderosa os empurra para trás.


Mas apesar do peso que carregam sobre seus ombros os mergulharem na lama algo mudou, um vislumbre dessa outra vida possível. Mesmo que ainda o mal conhecido seja melhor que o bom para conhecer, já tem uma noção do bom e do mal.

Agora há uma dor que já não é ressentimento do que nunca se teve, e sim nostalgia do que perdeu. E o que se perdeu, se pode recuperar.


Mesmo que um mandato muito forte tenha apagado seus passos trêmulos e tenham voltado a estaca zero, houve passos. Mesmo que agora esteja igual ou pior que quando começaram, teve avanços e isso é esperança.

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